"A casa dos meus delírios literários"


Palavras escritas são como melodias perfeitas,
que precisam de ritmo
ou vão "gritar" aos ouvidos sem nada dizer.
- Kane Ryu


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quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Segredo da Escuridão: Histórias Perdidas 13

O que temos por céu e por inferno é uma metáfora para nossas almas conflitantes. Dentro de nós temos a luz e a escuridão. Somos anjos e demônios, mensageiros e gênios da criação. Então como saber o que é certo e o que é errado? Simples, é só seguir o coração. Não adianta seguir costumes. Não adianta seguir os instintos. Não adianta se rebelar contra o sistema. É preciso acreditar e amar intensamente suas convicções.

A sintonia entre dois seres é igual. Quando dois corações entram em uma sintonia perfeita, ela nunca será quebra. Paixões avassaladoras são como tempestades, vem e vão. Amar é simplesmente estar ao lado de alguém, apenas para ver essa pessoa sorrir.

O céu vermelho indicava o inverno chegando novamente. Em Resende o frio era intenso e a noite já obrigava o uso de casacos para sair, pois a cidade fazia parte da região serrana do estado do Rio de Janeiro.

Já havia passado meses desde que Charlotte tinha visto Ben pela última vez. No entanto, uma certa desolação tomava conta do coração da lobisgirl, diante daquele crepúsculo vermelho. Eu a encontrei na janela de casa olhando o céu, com olhar perdido. Era visível que ela se sentia arrependida por sua escolha. Se afastar de Ben foi a coisa mais difícil que teve que fazer e se manter longe era ainda pior. Porém situações extremas pedem medidas igualmente radicais. Ben havia sido jogado em meio ao mundo das sombras e descobrir o segredo da escuridão nunca era fácil para um humano.

Charlotte se sentia culpada, pois ela o havia envolvido e para piorar, Ben quase morreu por isso. E mesmo que a distancia a fizesse infeliz tanto quanto fazia a ele, a lobisgirl acreditava que era o certo a fazer.

Uma recaída no Natal fez Ben ficar esperançoso, mas a história sobre os vampiros o assustou muito mais que ela podia prever. Nem diante da minha naturalidade, ao falar que estava envolvido com uma vampira, fez Ben fica mais relaxado. Andava nas ruas um tanto apavorado, com receito de trombar com algo não-humano.

Charlotte então achou melhor continuar afastada.

Só que também teve o dia na Bienal de SP, que a fazia remoer sua decisão.

_ Acredita que sinto falta até dele me chamar de... Charlotte. _ diz a lobisgirl fazendo uma careta _ Qual o problema dele? Charlotte parece nome da avó de alguém.

Eu tive que ri diante da cara desgostosa da lobisgirl.

_ Imagino o quanto reclamou com seus pais.

_ Não, não imagina... Claro, porque eles foram muito criativos. Charles e Charlotte, não tinham nomes mais criativos para arrumar para os filhos?

Eu observava a ruiva sentada no sofá a minha frente, enquanto ambos beliscávamos os biscoitos caseiros e o chá preparado pela avó de Charlotte, que nos deixou conversar em particular, apesar da curiosidade evidente com a minha presença em sua casa.

_ Será que sua avó acha que estamos namorando? Me olhou de forma estranha.

_ Não mesmo! Ela não gosta de cheio de vampiro... Você fede, Kane!

_ Hey! _ protestei.

A lobisgirl riu divertida.

_ Não reclama comigo, ela que falou. Não é pessoal, vovó fala o mesmo a sua vamp-namorada quando ela aparece aqui... Minha avó não tem lá muita noção do perigo ou qualquer papas na língua. _ comentou Charlotte bebendo mais um gole de chá, tentando não ri da minha indignação.

_ Ben sente muito a sua falta. _ eu disse de supetão, indo ao assunto que me levou a casa das lobas.

_ Droga, Kane. Veio aqui só para me deixar pior do que estou?

_ Não. Só estou te dizendo o que precisa ouvir. Ele não entende o motivo que a fez embora da primeira vez e menos ainda depois dos últimos encontros.

_ Eu não devia ter ido na casa dele no Natal, eu sei... Mas só fui na Bienal por causa do vampiro. Quando vi aquele vampiro entrando no ônibus, tive medo do Ben perceber algo errado...

_ E o vampiro acabar com a raça dele por ter sido detectado. _ completei _ E saudade de estar com Ben não teve nada com isso, não é?

_ Não. _ mentiu Charlotte.

Eu me aproximei um pouco, confidente e disse:

_ Então não devia ter levado Ben para... Uns amassos no banheiro do ônibus.

Charlotte corou como eu nunca vi antes e seu rosto ficou tão vermelho, que por um momento achei que ficaria da cor de seus cabelos.

_ Sinceramente, não acredito que ficar afastada vai protege Ben. Pelo contrário... Acha que vai conseguir vigiá-lo pelo resto da vida? Uma hora ele vai trombar com outro vampiro e vai acabar se lembrando. É um jornalista, observador e questionador por natureza.

_ Eu sei.

_ Ele lembra de você coberta de sangue. _ revelei _ Pensa que foi um sonho estranho, mas até enquanto?

_ Não pode! Estava inconsciente quando eu ataque a vampira.

_ Talvez não.

_ Droga! É tudo minha culpa. Aquela vampira louca não o teria pego, se não fosse eu.

Charlotte sacudia a cabeça em negação.

_ Por que eu não fiquei na minha?! _ questionou a si mesma _ Tinha que ir atrás dele depois do nosso encontro acidental na floresta.

_ Não adianta chorar o sangue derramado.

_ Eu sei, mas...

_ Mas nada. Ele faz parte de sua vida agora e você da dele. As escolhas de ambos os levaram a esse momento...

Fiquei mudo, arregalando os olhos incrédulo, enquanto olhava na direção da porta e Charlotte, que estava de costa para ela, seguiu meu olhar.

_ Como você chegou aqui?! _ indaguei, ainda sem acreditar que Ben estava ali, parado na porta da entrada da casa de Charlotte.

Ben olhou a sala, estilo início do século XX, era uma casa antiga, bem típica pela região de Resende e também bem conservada, com móveis igualmente antigos e conservados.

_ Te seguindo... Certo que por um momento eu perdi você de vista, mas depois de andar por quase meia hora, finalmente vi a placa na entrada da vila. _ diz Ben olhando para Charlotte que desviou o olhar _ Meu pai nunca falou que tinha uma vila tão próxima da Academia.

_ Porque provavelmente seu pai não sabe. _ eu disse olhando com cumplicidade para Charlotte _ Não adianta fugir de suas escolhas, tem que lidar com elas...

_ Ok, não precisa dizer mais nada, Kane. Eu entendi. _ diz Charlotte me encarando, sem ter coragem de olhar para Ben.

Eu me levantei e segui na direção da porta onde Ben estava parado, hesitante em entrar. Antes de sair, bati de leve no ombro dele e disse:

_ Não façam nada que eu não faria. _ pisquei e Ben riu.

_ Sim, Senhor Soberano das Confusões.

Minha fama de me meter em confusão é lendária, não tenho como negar, então fiquei calado. Minha namorada é uma vampira muito antiga, que podia acabar comigo num piscar de olhos e só por isso, eu não tinha moral alguma para questionar o comentário.

_ Quer que eu espere vocês conversar ou você o leva para casa? _ indaguei para Charlotte da porta.

_ Eu o leva. _ responder Charlotte sem olhar na nossa direção.

_ Eu volto sozinho. _ diz Ben num tom indignado, cruzando os braços irritado, com a atitude de Charlotte.

Tive que ri. Charlotte tinha muito o que falar a Ben.

Eu sai da casa antes de Charlotte falar algo, enquanto Ben ia até ela exigindo satisfações.

_ O que ele faz aqui? Por que o Kane pode vir a sua casa e eu você nunca... Vocês são amantes?

_ Claro que sim... Só se eu tivesse tendência suicidas.

Charlotte não explicou o comentário a Ben, mas falava do fato da vampira que me tinha por namorado ser muito ciumenta.

_ Então, vai me falar por que o Kane está aqui?

_ Por sua causa, tapado!

Ben ficou surpreso com a resposta.

_ Ele está preocupado com você. _ diz Charlotte fazendo sinal para Ben se sentar, mas ele se mantinha em pé.

_ Para com isso, senta logo.

Ben baixou os olhos e ainda em pé, após um breve silêncio, diz:

_ Sinto sua falta, Char.

Charlotte tenta engolir o choro, mas uma lágrima escapa e, solitária, corre por sua face.

_ Por que me afasta? Vejo que não é só você que vive no inferno. _ diz Ben com pesar.

_ Porque é melhor assim. _ responde Charlotte sem ter coragem de encará-lo.

_ Melhor? Eu sinto uma dor tão profundo quando estou longe de você que é quase física. E quando estou com você, é como estar no paraíso... E falo do simples fato de estar contigo.

Ben faz uma breve pausa e observa a lobisgirl por um breve momento, mas antes que Charlotte comentasse algo, ele completa:

_ E nem vem com aquela história que não sente nada, porque não vai colar.

Ben se senta ao lado de Charlotte no sofá, ignorando a indicação anterior dela, para ele sentar no sofá a sua frente, onde eu estava sentado antes. Então ele a abraça, puxando-a para si.

_ Droga, Ben, não faz isso. _ Charlotte reclama, mas sem ter vontade de se afastar dele.

A lobisgirl sentia tanta saudade de Ben, quanto ele sentia dela. Sem dizer coisa alguma, o jornalista, simplesmente, a beija e Charlotte se entrega aquele beijo de forma saudosa e um tanto desesperada.

Eu e avó dela estávamos escondidos do lado de fora. Eu queria ter certeza que os dois iam se entender e a avó dela me confessou que à anos pede aos deuses antigos que ela acredita proteger sua tribo, para mandar um companheiro para sua neta.

E, sim, a avó de Charlotte não gosta do cheiro de vampiro que tenho.

(Nota: Esse negócio de vampiros e lobisomens terem olfato apurado é muito constrangedor, especialmente em algumas situações. E é nessas horas que penso que a humanidade afinal pode ser uma benção.)

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2 comentários:

  1. hahaha, eu ri...quer dizer que Kane fede, huum? Aah, mas que fofo o ben! Essa Charlotte...¬¬

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  2. Essa história de "feder" é coisa do nariz de perdigueiro dos lobos. ;)

    E em defesa da Charlotte, tem um bom motivo para ser arredia com Ben... Longa história!

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